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Fotografia 291


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Terra Nova | Bahia | Brasil | Ano 2011


Tiragem 01: 01/15 Tiragem 02:

 

MATÉRIA DE POESIA


Todas as coisas cujos valores podem ser disputados no cuspe à distância

servem para poesia


O homem que possui um pente

e uma árvore

serve para a poesia


Terreno de 10 x 20, sujo de mato - os que

nele gorjeiam: detritos semoventes, latas

servem para poesia.


Um chevrolé gosmento

Coleção de besouros abstêmicos

O bule de Braque sem boca

são bons para poesia


As coisas que não levam a nada

têm grande importância


Cada coisa ordinária é um elemento de estima


Cada coisa sem préstimo

tem seu lugar

na poesia ou na geral


O que se encontra em ninho de joão-ferrerira:

caco de vidro, garampos,

retratos de formatura

servem demais para poesia


As coisas que não pretendem, como

por exemplo: pedras que cheiram

água, homens

que atravessam períodos de árvore

se prestam para poesia


Tudo aquilo que nos leva a coisa nenhuma

e que você não pode vender no mercado

como, por exemplo, o coração verde

dos pássaros,

serve para a poesia


As coisas que os línquens comem

- sapatos, adjetivos -

têm muita importância para os pulmões da poesia


Tudo aquilo que a nossa

civilização rejeita, pisa e mija em cima,

serve para a poesia


Os loucos de água e estandarte

servem demais

O traste é ótimo

O pobre-diabo é colosso


Tudo que explique

o alicate cremoso

e o lodo das estrelas

serve demais da conta


Pessoas desimportantes

dão pra poesia

qualquer pessoa ou escada


Tudo que explique

a lagartixa da esteira

e a laminação de sabiás

é muito importante para a poesia


O que é bom para o lixo é bom para a poesia


Importante sobremaneira é a palavra repositório;

a palavra repositório eu conheço bem:

tem muitas repercussões

como um algibe entupido de silêncio

sabe a destroços


As coisas jogadas fora

têm grande importância

— como um homem jogado fora


Aliás é também objeto de poesia

saber qual o período médio

que um homem jogado fora

pode permanecer na terra sem nascerem

em sua boca as raízes da escória


As coisas sem importância são bens de poesia


Pois é assim que um chevrolé gosmento chega

ao poema, e as andorinhas de junho.


Manoel de Barros

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